Há, sim, momentos na vida de um autor em que ele pensa em desistir. Por uma questão de simples bom senso, esses arroubos negativos não devem ser compartilhados publicamente. Vinícius já dizia que “O homem que diz ‘vou’ não vai, porque quando foi já não quis.” Dizer que quer desistir não é o mesmo que desistir de fato, é apenas um gesto de carência afetiva. Aquele que diz ‘vou’ quer é que alguém lhe diga ‘não vá’. Quer ter a impressão de que a sua permanência tem importância para alguém.
Só que a sua desistência ou persistência nada mudam na fila do feijão. Quem não se sentir estimulado a continuar e buscar esse estímulo nos outros, padecerá de carência ainda maior, porque os outros não estarão ‘lá’ onde ficarmos, para dar-nos a mão em nosso momento de sonho. Esses que têm palavras bonitas de apoio só têm mesmo palavras — talvez um ou dois tenham mais. Em regra, nenhum.
O autor deve buscar razões pessoais para escrever, ter em mente que não terá reconhecimento por seu esforço ou por merecimento, mas por uma combinação de fatores — que até pode incluir o merecimento, mas não em uma razão direta de seu tamanho, ou o esforço, mas não proporcionalmente à sua duração e dificuldade. Antes de nossa geração, muita gente de grande talento passou em branco pela vida. Você pode até acreditar que é especial, você pode até ser especial, mas para os outros isso não tem importância. No fim do dia, o que importa para os outros é se o seu livro se encaixa no que querem ler hoje. Ninguém o lerá — ou deveria ler — por pena e é melhor que seja assim. Pena é uma coisa horrível de se merecer.
O apoio que realmente lhe faz bem é a reação espontânea de pessoas que leram seu trabalho sem você implorar, gostaram dele e o elogiam sem que seja para manter sua autoestima a fim de você não cortar os pulsos hoje. Inclusive porque a história da literatura está cheia de gente cheia de talento que se matou. Algumas dessas pessoas haviam sido recentemente elogiadas, e muito, o que só prova que literatura não é algo mágico e que o problema da depressão não está necessariamente ligado às reações que os outros têm em relação a nós.
Quer escrever? Tenha humildade, insista e tenha paciência. Levante essa cabeça, não ligue para metas de curto prazo. Vá ler, vá interagir, vá escrever e vá prestando atenção aos conselhos, dicas e críticas que forem surgindo — espontaneamente ou a pedido. Nunca use seus pulsos (físicos ou metafóricos) como moeda para adquirir críticas positivas.
Se as críticas o desestimulam, o problema não são as críticas, é você. Literatura não é antidepressivo e nem namorada, é hobby (para uns) ou profissão (para outros). Em qualquer dos casos pode ser uma coisa muito recompensadora e contribuir para a sua felicidade, ou pode ser, se você não souber encarar com maturidade, mais uma coisa para chatear, estressar e deprimir.
Isso não é por culpa de uma limitação da literatura. Ela não tem personalidade e nem agência, é apenas uma ferramenta, um meio. Que podemos aproveitar maravilhosamente ou estragar.
Esqueça isso de que a literatura é a sua terapia. Ela até pode ser usada como parte da terapia, mas exclusivamente sob orientação de um terapeuta.