Ontem meu amigo Ronaldo Brito Roque, uma dessas inexplicáveis criaturas de Cataguases, brindou aos seus seletos leitores com um texto que realmente é destes que me dá vontade de ter escrito. Tenho isso, às vezes: leio alguma coisa e penso comigo que eu precisava ter sido o autor daquilo. O texto em questão é um delicioso conto sobre um restaurante que só serve três pratos; intitulados “o melhor”, “o médio” e “o pior”; e as reações dos fregueses a tal estranho cardápio.
Nas mãos de um reles autor de auto-ajuda isto provavelmente redundaria num texto de estilo parecido ao das “correntes de e-mail” que pululam na Internet, com uma moral bem tosca e óbvia ao final, para nos fazer ter algum tipo pasteurizado de “iluminação”. Mas Ronaldo Brito Roque não é um autor de tal naipe, mas um ironista hábil, que reduz a pó qualquer intenção moralista, e o texto termina mais fazendo troça do que ensinando.
Existem, claro, algumas falhas no texto. Especialmente o final, que poderia ter sido o melhor,[^1] mas foi apenas o médio. Mas a habilidade do autor em evitar a pieguice faz com que o andamento geral da história recaia na sátira, e não na parábola filosófica religiosa *self-service* que agrada às massas.
Não vou falar muito mais sobre o texto, vou deixar que vocês o saboreiem com cuidado, e que se perguntem quantas vezes na vida não se contentaram em pôr umas alcaparras por cima de algo medíocre, torcendo para o cliente não saber reconhecer o melhor que você pode fazer.
[^1]: Pergunta-me o autor deste texto: “mas, afinal, de que forma **você** teria escrito o final?” É uma pergunta justa, tanto quanto é difícil de responder. É sempre muito mais fácil detectar algo “errado” do que sugerir o melhor conserto. Séculos antes da invenção do remédio a medicina já tinha o diagnóstico. Acredito que eu teria feito um final mais cético, no qual o cozinheiro não desse nenhuma lição de moral do tipo autoconfiança, valorização de si próprio, etc. Faltou ao cozinheiro um pouco mais de desprezo pelos fregueses. Não que uma dose extra de desprezo tornasse o texto mais crível. Literatura não tem que ser crível. Tem, aliás, que ser incrível. Coisas críveis eu leio nos jornais. Refiro-me apenas que tal atitude tornaria o todo mais harmônico. Pelo menos em minha modesta opinião.