O silêncio que fica no ouvido quando evapora o acorde final,
a morna penumbra que corre nos olhos logo que a luz se apagou,
a doce ausência que ocupa o corpo quando se extingue uma dor…
nada disso faz sentido em si, mas tudo isso
assobia no fundo da alma a confissão de uma imagem:
pode ser que a tristeza não seja,
pode ser que o espaço deixado ainda cheire ao que havia.
O silêncio doído insiste insípido acinte,
os olhos aos poucos se rendem, a cortina vermelha se despe
e enxergamos o negro líquido — e dentro dele outras cores, noturnas.
Toda vez que uma presença termina, fica vazio um espaço
que aos poucos se enche de todas as outras coisas.
Quando você morreu para mim eu não pensava em nada
e teria morrido sem saber de muitas coisas.
Mas hoje, mesmo que ainda haja um fantasma, uma dor, uma folha
que voa no ar no dia certo…
Ah, mesmo com tudo isso tem tantas coisas crescendo,
tem uma vida acontecendo, uma morte se prepara na distância
e tudo que eu não vivi parece agora pequeno
ilhado entre as lembranças reais, as invenções e os sonhos.
O silêncio que fica no ouvido quando um ruído evapora
é como uma surdina na música do mundo, que tocava sem eu ouvir.
A penumbra nos olhos é só falta de costume: enfartado de luz,
o olho não sabe enxergar beleza sem milhares de cores.
Alguém fugiu com todas elas, fiquei achando que estava cego,
mas tenho visto tantas nuanças ao luar
que aprendi cores que ninguém via.