Eu nunca tive a oportunidade de ler obras que ensinassem como escrever. Não que isso fosse fácil quando eu comecei, na era pré-Internet. Sem ter nenhuma orientação, acabei tendo que improvisar e desenvolver meus próprios métodos para produção de textos. Hoje vou explicar um desses métodos, que eu usei principalmente para contos e poemas.
Antes de falar sobre o “método cebola”, devo explicar que ele é totalmente inadequado para textos mais longos. Ao tentar empregar este método para escrever um romance, chamado “Praia do Sossego”, eu demorei nove anos até conseguir terminar. Eu ainda tentei empregá-lo para outro romance, “O Reino Esquecido”, e não estou mais conseguindo fazê-lo avançar.
O “método cebola” consiste em fazer sucessivas revisões do texto, que acrescentam novas “camadas” de complexidade, até ele, finalmente, chegar a estar completo segundo o plano original. A criação do texto é divida em três etapas: sinopse, rascunho e revisões.
Inicialmente você faz a sinopse da história ou ideias que pretende desenvolver. Como se sabe, o tamanho ideal de uma sinopse de trabalho é um único parágrafo, constituído de no máximo dez frases na ordem direta. Há outros tipos de sinopses, como as que são feitas para aparecer em contracapas de livros, que são diferentes, porque tem objetivos diferentes.
Na etapa do rascunho você conta a história toda, do começo ao fim, sem dar atenção aos detalhes, sem se preocupar em desenvolver muito os personagens, sem fazer muita descrição. O objetivo aqui é meramente fixar as suas ideias sobre o texto, e começar a dar forma à linguagem e ao tom que ele deverá ter ao final. Não cheguei a concluir por um tamanho ideal para o rascunho, porque isso vai depender da complexidade da história e do quanto você a quer detalhar. O que é necessário é que o rascunho conte toda a história, apresente todos os principais conflitos. Quando você escreve o rascunho, a preocupação seguinte deverá ser com aperfeiçoamento, não com conclusão.
Tendo em mãos um rascunho da história toda, que corresponde à primeira camada da cebola, você vai revisitar a história, do começo ao fim, fazendo as modificações e correções que julgar necessárias. Isto pode envolver até mesmo reescrever trechos inteiros, inserir personagens, apagar cenas, inverter a ordem (cronológica ou de apresentação) das cenas narradas, etc. Esta segunda camada da cebola é o momento no qual você vai dar atenção aos personagens e notar as relações cronológicas das cenas (evitando, por exemplo, que alguém não entrou na sala saia dela ou que alguém morra pela segunda vez).
A terceira, e idealmente última, das camadas da cebola é a revisão estilística, momento no qual você vai dar aos personagens falas características. Também pode sera hora de detalhar as descrições do ambiente ou inserir sugestões sutis do que virá a seguir. Flashbacks ou premonições são interessantes em alguns tipos de histórias, e é nesse ponto que eu acho que eles devem ser inseridos e concluídos.
Após a terceira camada, você ainda pode fazer uma quarta revisão, apenas para aparar arestas do texto. Esta revisão final deve ser voltada exclusivamente para a gramática ou, talvez, para a linguagem dos personagens, harmonizando-a com o conceito que você faz deles. Quando você chega nesse ponto, é hora de dar por terminada a sua obra e parar de caçar chifre em cabeça de cavalo: sempre haverá imperfeições a corrigir, e se você ficar sempre caçando, nunca deixará de achar. Os últimos erros, deixe pro revisor, se algum dia for publicar.
O “método cebola”, acima descrito, provou-se muito útil para mim, especialmente em poemas (eu o desenvolvi originalmente para poesia) e em contos curtos. Acredito que possa ser útil para outros jovens autores que têm dificuldade para organizar seus pensamentos (eu ainda tenho e preciso desses estratagemas e fórmulas para tentar me colocar no rumo). Por isso o compartilho aqui, na esperança de que muita gente vai escrever melhor (ou vai passar a escrever) com a ajuda dele.
Para quem desejar, porém, um método mais direto e menos perfeccionista (que pode levar à conclusão de um romance em três semanas e meia), eu volto a falar, ainda esta semana, sob o “método quebra-cabeças“.