Tudo indica planos antigos do João Santos, dando por fim num safári combinado com discrição a poucos dias da confirmação da partida. Tudo no cartão, dividido para não ficar muito no orçado — mas como muito funcionário público da alta roda, não havia motivo para o cuidado: havia fundos para isso ou mais, mas João quis diluído, convinha assim. Partiu no sábado, voo da South African, todo pronto para uma folga curta. Só comprou o conjunto típico numa loja lá. Durban foi o início, dormiu […]
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Uma Fábula Cataguasense
Cataguases de antigamente, cidade que evapora da memória como chuva no estio. Cidade em que aconteciam coisas estranhas que nossos pais contavam e que agora, idosos, eles ficaram com vergonha de contar, porque o mundo novo admirável gosta de rir das histórias de antigamente. Havia na cidade uma leiteria anexa à Cooperativa Agropecuária de Cataguases, hoje extinta. Mas a história não fala da falida empresa, nosso personagem é um burrico comum, igual a muitos outros, que puxava a carroça do leiteiro todas as manhãs. Madrugava […]
A Um Amigo que Foi Cedo
Hoje perdi um amigo. Era um sujeitinho peludo e de nariz frio, algo tristonho (talvez de saudades das ruas e das cachorras), mas era um desses que a gente se afeiçoa fácil. Até eu, que nunca tivera nenhuma vontade de ter um. Eu o apelidara de Bob Cachorrovich Viralatov porque o recebi em adoção em uma época em que estava, novamente, tentando aprender russo. Achei apropriado e ele não se importou. Ele não era do tipo que se importava muito. Enquanto houvesse água em sua […]
O Estilo Cucaracha
A barata é uma criatura que testa a engenhosidade do ser humano, mas também os seus dotes marciais. Nada é mais revelador do caráter de um homem do que o inesperado encontro com uma cascuda voadora a zumbir no escuro. Deve ser por isso que H. P. Lovecraft escreveu que o título original do Necronomicon era Al Azif, supostamente “o zumbido”. Uma barata voadora no escuro é uma ameaçada alada à masculinidade de qualquer barbado fã de death metal escandinavo. Agora há pouco tive um […]
Bob e o Felino
Não temos gato, mas temos o lado ruim de ter um gato. Se é que vocês me entendem. O vizinho tem o gato, nós temos cachorro, o Bob (formalmente chamado de Roberto Cachorrovich Viralatov, porque é quase um personagem de Dostoievski). O Bob detesta o gato do fundo de sua alma lupina remanescente. O gato, bem, meh… Toda noite o gato se deita para dormir na beira da varanda do vizinho, que é visível de nosso quintal. Bob vai até o gramado, o mais perto […]
Ora, Pombas!
A pomba pousou no teto do casebre que o artista tentava desenhar. Ele agitou os braços na direção dela, como se quisesse estapeá-la, mas em vão, e logo se conformou que não conseguiria proibir pássaro nenhum de pousar nos tetos para descansar de suas aventuras. Então pegou e comeu uma das batatas cozidas que ainda restavam no prato do almoço que mal tocara. Quando olhou de volta, havia outra pomba pousada ao lado da outra e então desejou apagar toda pomba de cada teto. Começou […]
Sobre Animais e Pedestres
Ando pensando em reavaliar meus conceitos sobre a inteligência humana. Não bastassem as recentes descobertas que evidenciam que a maioria de nossos comportamentos são reações a estímulos determinados e que, conhecendo estes, é possível induzir àqueles, não cessam de surgir evidências, também, de que os bichos podem apresentar comportamentos muito mais racionais do que o de certos “senhores da natureza”. Eu tinha ido fazer compras enquanto minha mulher arrumava o cabelo em um salão de beleza. Enquanto procurava uma vaga para estacionar, parei diante de […]
Um Hai Kai Gastronômico
Quem come ostra e camarão
come qualquer coisa,
menos escorpião.
Tempo de Semear, Tempo de Colher
Estas montanhas têm uma história, desde os tempos dos índios, desde antes do primeiro português cortar a primeira árvore. Eles vieram, viveram, morreram, viram o mal que havia e se foram, ficaram apenas alguns pobres puris isolados, entocados quase como bichos. Vieram os emboabas a caminho das minas, tentaram fixar-se aqui, mas não ficou nenhuma vila, queimaram todas as casas, sumiram no tempo como se nunca tivessem pousado, e a estrada real passou ao largo.
O Ódio à Poesia
Acabo de me deparar no Facebook com alguém compartilhando a pequena história em quadrinhos acima. Logo que a li percebi que ali havia assunto para mais do que meramente um “Curtir” ou um “Compartilhar”, mesmo porque não me senti impelido a nenhuma das duas coisas. Como aquela rede social não é muito receptiva a elucubrações mais compridas, preferi postar aqui, mesmo sabendo que menos gente lerá, curtirá ou compartilhará. > Texto escrito em 2012 como resposta à divulgação de uma tirinha em que se manifestava […]