Introdução Houve uma época, há não muitos séculos, em que o termo “academia” tinha um prestígio inabalável. Era, também, um tempo no qual as pessoas se sentiam muito identificadas com a monarquia, por razões as mais diversas, principalmente religiosas.1 Eram tempos brutos, nos quais a fogueira ou os instrumentos de tortura (quando não ambos) eram o destino de pessoas que não pensavam de acordo com a regra dominante. Eram tempos nos quais uma pessoa poderia passar a vida inteira em uma prisão para doentes mentais2 […]
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Coisas de Minha Terra
Apontamentos avulsos e incompletos encontrados datilografados sobre o verso de páginas contendo alguns poemas. Tanto os poemas quanto esses apontamentos haviam desaparecido de minha lembrança. A data (dos poemas) é 1994, a destes apontamentos deve ser um pouco depois (um ano, no máximo). Trata-se aqui do texto mais antigo cuja forma original não tem influência alguma de revisões posteriores. Uma verdadeira relíquia da época em que eu ainda estava aprendendo a tentar escrever. Mais do que isso, parecem ser apontamentos para um glossário que ficaria […]
O Meu Melhor Amigo
Um conto pessimista escrito em 2003, em homenagem a um melhor amigo real, que não quebrou um braço, mas disse algumas das coisas que o personagem expressa. O meu melhor amigo voltou das férias ontem com um braço quebrado. Ninguém ainda parece haver notado nada de estranho nisso, como se férias normalmente quebrassem ossos. Mas eu não me contenho de perguntar por que motivo alguém voltaria do litoral com um membro na tipóia. Nada porém que me leve a romper o silêncio que ele, por […]
Sobre Contos e Contar Histórias
Escrever contos é uma atividade das mais prazerosas, se bem que difícil. Para mim especialmente, escrever histórias sempre foi — mais que um mero requinte — um objetivo que eu sentia essencial, um desafio de caráter quase pessoal a que me propus desde que escrevi meu primeiro poema sobre a “Chuva” (1988, perdido). No entanto, foram necessários muitos anos até que minhas primeiras tentativas bem-sucedidas viessem à luz. Esta demora deveu-se, em parte, à minha convicção de que escrever histórias era extremamente difícil e demandava […]
Velocípede
Uma semelhança entre a realidade e sonho é que as duas coisas não tem começo. Da mesma forma como não nos recordamos das primeiras cenas de um sonho, tampouco nos recordamos das primerias coisas que vimos, sentimos, cheiramos, bebemos, pensamos. Cada um de nós vive como em um interminável sonho, do qual talvez acordemos um dia bêbados do cansaço da noite. E se morrer em meu sonho, o que acontecerá comigo na invisível cama na qual, calmamente, eu repouso? Eu não sei exatamente quem sou. […]
O Fascínio das Papelarias
Quando eu estudava, ainda não existiam essas pequenas maravilhas eletrônicas que hoje caracterizam nosso dia-a-dia. Pesquisas eram feitas em bibliotecas empoeiradas — o bibliotecário era tido como um repositário de saber, reverenciado. Os trabalhos eram penosamente manuscritos, depois transcritos à máquina ou simplesmente passados a limpo por quem tivesse letra bonita. E o trabalho de rascunhar era ainda mais dificultado pelo tipo de material com que tínhamos de trabalhar. Há vinte anos, não existiam mais que quatro marcas de caneta esferográfica (Bic, FaberFix, Compactor e […]