Júlio era um “programa humano”. Esse era o nome pelo qual os líderes do Magistério Supremo os chamavam. Pessoas cujos cérebros haviam recebido, ao longo de uma vida inteira, informações subliminares destinadas a prepará-las para o momento em que o Grande Mestre resolvesse usá-las. Todos sabiam que os programas humanos eram amplamente conduzidos na Terra inteira e muitos os odiavam, mas vivia-se um tempo em que até odiar o Magistério já se tornara algo cuidadosamente controlado, pelo Magistério. Sempre tivera a impressão de que o […]
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Contato Mais ou Menos Imediato
Apareceu de repente um barui estrãe no motor do caminhão, chamano a atenção do Remundo, que cochilava no banco de carona pro Jailso dirigir. Tava de madrugadinha e era lua minguante, num dava para ver nada no escuro daquele fim de mundo. — Jajá, para o caminhão. Encostar ali era perigoso: ês tava no meio do nada, estradinha de terra. Canavial dum lado e dotro. Não tinha nenhuma luz de cidade apareceno no céu. — O que foi, Mundim? — Um barui no motor. — […]
Tristeza Nova
A tristeza deste século que chega será de não haver mais horas mortas e nem fantasmas nelas. Um mundo iluminado, limpo e organizado, sem espaço para transgressões. A melancolia será subterrânea e todos acuados, teremos de ter e de ostentar. Os seres tristes sorrirão também e se atracarão às luminárias em busca de pé no remoinho. A agonia que haverá na nova era será o som do mundo ininterrupto acima da perspectiva do infinito, mais forte que o pulsar dos corações. Um mundo preenchido, pleno […]
Guardai-nos do Mal
Prólogo para um romance de ficção científica iniciado em 1999, que eu nunca procurei terminar porque descobri que J.G. Ballard já havia escrito uma história parecida demais. As ruas são perigosas. Sair de casa envolve sempre riscos. Por isso procuramos fortalezas, compartimentos isolados para nossos sonhos estanques. Moro em um edifício preparado para isso. Nele moram comigo cerca de mil pessoas, mais ou menos, todas em apartamentos parecidos, de duas ou três peças. Moramos aqui há mais de quinze anos e mesmo depois aqui ainda […]
Não Vamos às Estrelas, Baby…
Há anos um parágrafo escrito por Howard Phillips Lovecraft não me sai da cabeça. Já o devo ter traduzido uma dezena de vezes, para postar em duas ou três dezenas de lugares. Aqui vai a décima primeira tradução, como introito deste artigo que, mais uma vez, me alijará de alguns amigos e leitores: A coisa mais misericordiosa no mundo, creio, é a incapacidade da mente humana para interligar todos os seus conhecimentos. Vivemos em uma plácida ilha de ignorância em meio aos mares negros do […]
Epifania — Capítulo 2
Este texto continua a história iniciada em janeiro, aqui. A reunião dos tripulantes durou preciosas horas, durante as quais Kenji permaneceu mais alerta às vaguidões do espaço — com seus perigos e desejos — do que aos sons contraditórios emitidos pelos aparelhos fonadores de tantos humanos confusos. Ouvir aquela algaravia não trazia-lhe nenhuma informação definida, diferentemente do vácuo, onde podia ver a dança dos planetas daquele sistema tão calmo, tão semelhante e ao mesmo tempo tão diferente em relação a um distante outro, que somente […]
O Mundo Fantástico de Howard Phillips Lovecraft
Edição independente de uma coletânea de algumas das obras mais significativas do mestre americano do horror cósmico. Participei com as traduções de cinco contos: A Busca de Iranon, Um Sussurro nas Trevas, O Inominável, O Depoimento de Randolph Carter e O Habitante das Trevas. A Edição da Clock Tower é um projeto ousado, movido apenas pelo trabalho de voluntários (tradução, revisão, ilustração, projeto gráfico, catalogação) e com a proposta de venda a um grupo fechado de compradores, ele dá à luz um volume que deve, […]
Sonhos Para as Próximas Décadas
Eduardo Galeano — jornalista, cartunista e escritor uruguaio — publicou uma série de coisas que sonhava acontecessem no mundo após a virada do século. Considerando a natureza da prosa deste autor, o tipo de coisa que ele sonhava não é inesperado; mas para muitos soará estranho, pois há os que pensam que este autor se limitou às Veias Abertas da América Latina, obra que a esquerda toma como bíblia e a direita renega como se fosse um grimório satânico. Por causa do peso deste livro […]
Impressões da Leitura de “Piquenique na Estrada”, dos Irmãos Strugatsky
Retornando hoje de meu breve exílio da internet, relato um feito proporcionado pelo meu isolamento em relação às distrações que existem na Rede: terminei finalmente a leitura de Roadside Picnic (título da tradução americana), um clássico da ficção científica soviética, de autoria dos irmãos Bóris e Arcádio Strugatsky. Aproveito agora para compartilhar com vocês minhas impressões. Inicialmente vou dizer umas breves palavras sobre os autores. São tidos pela crítica especializada como verdadeiros gênios literários incompreendidos, cuja obra não pode ser perfeitamente fruída pelos ocidentais devido […]
Algumas Palavras Sobre a Obra de William Hope Hodgson
Vocês que acompanham este blog devem ter notado que iniciei um projeto de tradução do romance “The House on the Borderland”, a que intitulei “A Casa no Fim do Mundo” (o título significaria, literalmente, “A Casa Sobre a Fronteira”, mas isto faria pouco sentido para o leitor, razão porque preferi mudar). Como a obra é desconhecida no Brasil (apesar de ter sido escrita no início do século XX e até já estar, inclusive, em domínio público), alguns podem estar perguntando o que motivou a minha […]