Eu não sei por quanto tempo ainda habitarei esta cidade, esta casa, este corpo, este plano. Este fruto que apanho tem o azedo da infância, tem a beleza da primeira cor; perdida numa curva da planície a que chamam vida. Plantada a ávore, lenta espera em um jardim que é meu, por ora, onde uma esperança viveu, mas já não mora. Não sei o quanto ainda tenho, ou quanto escorre. A fruta é um momento, que já morre.
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A Persistência
Minhas lista de links chamou-me a atenção hoje pela coincidência de quase todos os membros dela, exceto o infatigável Sérgio Ferrari, do blog “Astro Miau”, estarem encerrando as atividades. Félix Maraganha já havia abandonado a literatura há cerca de um ano, em um episódio triste, que incluiu jogar no lixo todos os seus originais inéditos e os exemplares de suas obras publicadas. Episódio de que não restou registro porque agora o seu “Calango Abstrato” é um blogue privado. Felipe Holloway não atualiza o “Estou numa […]
Tradução: A Vinda do Verme Branco, 3 (C. A. Smith)
Ele teria fugido da casa, sabendo que sua magia era totalmente ineficaz contra aquilo. Mas compreendeu que a morte estava na exposição direta aos raios do iceberg e que se deixasse a casa ele forçosamente entraria naquela luz fatal. E também compreendeu que ele só, entre os que viviam naquele trecho de litoral, tinha sido excluído da morte. Não podia supor a razão de sua exceção, mas concluiu por fim que era melhor permanecer paciente e sem medo, à espera do que lhe devesse acontecer. […]
Tradução: A Vinda do Verme Branco, 2 (C. A. Smith)
De volta à sua casa antes da noite, queimou junto a cada porta e janela as resinas que são mais ofensivas aos demônios do norte, e em cada ângulo por onde um espírito pudesse entrar ele situou um de seus familiares para guardar contra a intrusão. Depois, enquanto Ratha e Ahilidis dormiam, ele pesquisou com cuidado diligente nos escritos de Pnom, nos quais estão coletados muitos exorcismos poderosos. Mas o tempo todo, enquanto lia para seu conforto os velhos autógrafos, ele se lembrava melancolicamente dos […]
Avós Rebeldes
Quando criança eu li “[Vovô Fugiu de Casa](http://www.lpm.com.br/site/default.asp?Template=../livros/layout_produto.asp&CategoriaID=848474&ID=384818)”, de Sérgio Caparelli (taí o link, comprem e leiam pois é bom demais). Essa obra foi uma das mais impactantes de toda a minha vida. Várias vezes me peguei reescrevendo histórias que começam com personagens pondo o pé na estrada, tudo por causa do velho que resolve fugir de sua vida deprimente e passar suas últimas semanas ou meses de vida curtindo a serra gaúcha em companhia do neto que sofria bullying na escola. A cena em […]
A Paisagem com Salgueiros
Original de Clark Ashton-Smith. Traduzido a partir da versão online em Eldritch Dark. A pintura tinha mais de quinhentos anos e o tempo não mudara suas cores, senão para tocá-las com a tenra suavidade das horas antigas, com a morbidez acumulada de coisas passadas. Fora pintada por um grande artista da dinastia Sung, em seda da mais fina trama, e montada em uma moldura de ébano arrematada em prata. Por doze gerações fora uma das mais queridas posses dos antepassados de Shih Liang e igualmente […]
Rito de Passagem
Há momentos na vida em que você subitamente se dá conta de que as suas certezas viraram dúvidas, e tudo que era sólido parece poeira ao vento. Então você percebe que não adianta mais lutar, que a luta era uma violência inútil. Melhor render-se ao inevitável, flutuar na correnteza da vida, que todos sabemos para onde vai. Vai-se o anel, para a gaveta ou para o olvido, mas fica a mão inteira, e uma vida que resta.
Guardai-nos do Mal
Prólogo para um romance de ficção científica iniciado em 1999, que eu nunca procurei terminar porque descobri que J.G. Ballard já havia escrito uma história parecida demais. As ruas são perigosas. Sair de casa envolve sempre riscos. Por isso procuramos fortalezas, compartimentos isolados para nossos sonhos estanques. Moro em um edifício preparado para isso. Nele moram comigo cerca de mil pessoas, mais ou menos, todas em apartamentos parecidos, de duas ou três peças. Moramos aqui há mais de quinze anos e mesmo depois aqui ainda […]
Quanto Você Quer Pagar?
Quanto você pagou pelo seu dia de hoje? Nada? Tem certeza? Provavelmente você está enganado, tanto quanto eu estive durante décadas perdidas de minha vida. Cada dia que você vive está pago, e muito bem pago, com uma moeda cujo valor subjetivo é maior que o do dólar e o do iene: a liberdade. É com liberdade que você paga por lhe terem deixado vivo mais um dia. Com ela você comprou, indiretamente, o pão e o café que o prepararam para outra jornada. Esta, […]
"Doze Passos" para Dependentes Tecnológicos
Admita que se tornou um viciado tecnológico e que este vício o está destruindo. Acredite que é possível encontrar a salvação. Para inspirar-se, abra uma janela, exponha seus olhos à luz brilhante que há no mundo lá fora, bem devagar para que o sol não queime suas retinas acostumadas a trevas e luz artificial. Depois de alguns dias seus olhos terão aliviado os sintomas da síndrome de abstinência de radiação eletromagnética do monitor e poderão suportar a luz do sol melhor, ponha óculos escuros e […]