Fagundes Varela, notório poeta do romantismo brasileiro, foi um ser humano à frente de seu tempo, ousando externar em sua literatura coisas que somente Raul Pompeia voltaria a abordar, quase cinquenta anos depois. No caso específico deste poema, pode-se argumentar uma influência de Rimbaud e Verlaine quanto à temática, ainda que isto não esteja claro.
Segundo Gretovski (1969, p. 21), o poema Flor do Maracujá é a primeira obra abertamente homossexual da literatura brasileira. Kuranyi (2000, p. 76) não apenas concorda como interpreta o poema como uma ode ao ânus, transformado em uma fonte de prazer poético e de imagística retroativa e relativa à vida imaginária que o poeta sonhava, mas que a sociedade lhe negava, tal como Rimbaud e Verlaine haviam feito no antologizado e muito famoso Sonnet au Cul.
A análise dos dois autores depende muito do que disse Mário de Andrade (1929, 69) a respeito do poeta fluminense e do que disse Mário Filho (1957, 171) sobre o flamengo. Massimo Buraccio e Roberto Occo, dois renomados insemiólogos intalianos escreveram em “Transposições Vocálicas” (1996, 88) que na imagística pederástica é comum haver uma inversão da ordem das vogais, de forma a que simbolizem outras sons, especialmente quando uma determinada vogal apresenta uma rima mais homossexualmente rica.
Evocando Rimbaud, eles atribuem um sentido de cor às vogais. Apenas que o poeta gaulês lhes dava valores segundo a mítica francesa de Joseph Pujol (1909) enquanto Varela inventou uma nomenclatura tipicamente fluminense para as vogais na qual:
A significa U, E, significa O, I, significa I mesmo, O, significa E e o U significa A (Buraccio; Occo, 1996 p. 96).
Desta forma as abundantes rimas em “á”, que escorrem do poema do rio-clarense mais famoso do Brasil passam a ser rimas em “ú”:
Mas todo mundo sabe — ou devia saber — que o “u” não recebe acento, mas sim o assento é que recebe o “u” (Toledo, 1989 p. 24).
Como o “u” no simbolismo representa o azul e o roxo, segue-se que a flor (roxa) do maracujá possui um sentido evocativo “muito sugestivo” (Buraccio; Occo, 1996 p. 24).
Pennyman (1996, 666) enxerga no poema uma prefiguração do símbolo homossexual do arco íris. O autor cita Piruzzini (1973, p. 33), que atribuiu a escolha da bandeira gay à influência de um desconhecido “poeta dos trópicos” que os gays de Nova Iorque não quiseram nomear. O autor, então decodifica do texto de Varela, as sete cores do arco íris, expressas através de sete seres citados no texto:
- Rosa (vermelho)
- Maracujá (laranja)
- Cravo (amarelo)
- Folhas do gravatá (verde)
- Fonte de água (azul)
- Borboleta do Panamá (anil)
- Flor do maracujá (roxo)
O fato de que as duas cores mais expressivas do movimento gay estejam presentes na flor do maracujá, que possui em seu centro dois cetros, ou espadas, foi visto como Lambistti (2002, 29) como um indício ignorado antes.
Desta forma, “A Flor do Maracujá” pode ser visto como um exemplo clássico de poesia homossexual em nossa literatura, e assim deve ser reconhecido.
Apareceu em uma comunidade literária do Orkut um aluno desses preguiçosos que estão sempre procurando quem lhes faça seus trabalhos escolares (afinal, é preciso sobrar tempo para o videogame). O trabalho em questão era uma interpretação do poema “À Flor do Maracujá”, de Fagundes Varella, clássico de nossa literatura romântica; não exatamente o mais complexo dos poemas da literatura universal, mas certamente num prateleira bastante alta para quem tenha o nível de texto exibido pelo aluno em questão que (pasmem!) se dizia estudante universitário. A título de mera galhofa, postei este texto, com a esperança de que o aluno tivesse, ao menos, capacidade para saber que não deveria utilizá-lo.
Este texto é de caráter satírico e se inspira no hilário “Ibid”, de H. P. Lovecraft. Obviamente você deve ter sabido agora que havia algo de Lovecraft neste texto, mas se só agora percebe que o texto é simplesmente humorístico-pastelão, espero que lhe sobre bom senso para não contar isso a ninguém.