Manézim era a maior preocupação dos pais. Já tinha quatro ano o moleque e não falava nada ainda, só ficava quieto no seu canto com os brinquedos. Mas ele tinha um jeito assim estranho de olhar. Mirava nas pessoas os seus oinhos e abria um pouco a boca, como se tivesse bebendo o que falavam. Mas naquele tempo a gente pobre da roça não tinha muito recurso de médico, então o tempo ia passando e Manézim não falava e a família só se preocupava.
Era um dia qualquer, nem feriado nem domingo. Tava todo mundo almoçando em volta da mesa, com se fazia antigamente, antes da televisão. Manézim comia distraído, olhando pros destroços da galinha frita na travessa, talvez pensando que um dia antes a coitada ciscava distraída no quintal. O irmão mais velho, guloso como ele só, já tinha terminado seu prato e pedia mais:
— Mãe, me dá mais dois ovo cozido.
Manézim então, pro espanto da família, interrompeu seu silêncio que vinha desde o nascimento para falar uma palavra solitária:
— “Ovos”.
O pai engasgou com a asa da galinha e a mãe deixou cair o garfo que espetava um ovo. Todo mundo levantou e foi pegar no menino, dizendo:
— Meu filho, ocê falou.
— Olha, Rosa, que o moleque não é retardado não.
— Esse bostinha começa a falar já me corrigindo!
Foi tanto falatório que Manézim foi se encolhendo na cadeira, com os olhinhos arregalados. Até que a mãe, percebendo que ele já tava demorando a falar outra palavra, tratou de provocar:
— Vai, meu filho, fala para mim!
Manézim olhou em volta a família toda reunida espiando o que ele fazia. Pensou e falou:
— Não falo mais.
E mais não falou. Por fim, cansado daquilo tudo, o pai resolveu tomar providências. Vendeu um novilho e foi à cidade levando o garoto para uma consulta com um pediatra. O doutor examinou o garoto durante um bom tempo, mas por fim declarou-se impotente para resolver o problema:
— Acredito que os senhores não tenham muito com que se preocupar. A capacidade cognitiva de seu filho não me parece afetada, ele apenas é lacônico.
— Isso tem cura, doutor.
O médico sorriu, e tentou tranquilizar o preocupado pai.
— Acredito que deve melhorar com o tempo, sem precisar de remédio. Mas ele parece não gostar muito mesmo de falar, embora entenda tudo que dizemos. De toda forma, volte daqui a alguns meses para acompanharmos como vai o menino.
Naquela tarde um arrasado pai chegou em casa, muito preocupado, e trancou-se no quarto com a esposa.
— E então, Manél, o que tem o moleque?
— Parece, Rosa, que nós temos um filho lacônico.
Rosa ficou mortificada. Vários fios de cabelo brancos devem ter nascido em sua cabeça naquela tarde.
— Ó meu Deus! O que vai ser de nosso meninim?
— Temos que ser fortes, Rosa. Pelo menos o doutor falou que melhora com o tempo.