Caro leitor, tenho de confessar, tem dias que me dá uma vontade estranha de esquecer o inglês! Lembro-me das palavras da velha Dolly Pentreath — que eu nunca conheci e cuja voz jamais ouvi — em seu leito de morte, gemendo para as paredes Me ne vidn kewsel Sowsnek! Me ne vidn kewsel Sowsnek! Como ela eu também gemo para as minhas paredes, com séculos de antecipação, que não quero ser obrigado a falar o inglês! Temo que meu brado seja em vão, mas eu vou ainda assim dar os meus resmungos, na esperança de alguns que me ouçam transformem este incômodo em um murmúrio audível.
As pessoas dão um valor excessivo ao inglês. Tem gente demais exibindo “tinturas” de inglês, tal feiticeiros murmurando abracadabras em línguas mortas. As pessoas esperam dar “cor cosmopolita” aos seus blogues, com a ajuda de alguns bye-bye e de alguns títulos traduzidos com o dicionário. Muitas dessas pessoas nem sabem que dentro de algumas décadas poderão estar sendo obrigadas a estudar chinês, árabe ou, se as coisas derem certo para nós, português!
Eu não gosto das pessoas que vão na onda. Surfe nunca foi meu protótipo de esporte favorito. Se é verdade que os que ficam no caminho da história são pisoteados por ela, nada é tão belo quanto um “tank man” em sua Praça da Paz Celestial. A tragédia cômica dos quixotes possui maior grandeza do que o sucesso obsceno dos vendidos. São os vilões que se vendem, e heróis sempre morrem no fim. Mesmo assim você não lê o ciclo arturiano torcendo por Mordred e nem assiste uma encenação de Hamlet torcendo pelo rei Cláudio.
Por isso, caríssimo leitor, que me sinto incomodado com a invasão inglesa que vai por este país. Incomoda-me que eu tenha tido que escrever este texto com a ajuda de pelo menos um anglicismo porque ninguém sabe dizer “tank man” em português, não de uma forma evocativa. Penso que no futuro haverá cada vez mais termos que não poderão ser perfeitamente expressos em nossa língua, tal como, num distante passado, nossos caipiras achavam que certos conceitos não poderiam ser expressos em tupi. Amigos, temo que o português brasileiro seja o tupi do futuro.