Letras Elétricas
Textões e ficções sem compromisso
by J. G. Gouvêa Atualizado em 2021-05-05

Blogs que Leio: Wilson Vaccari

Publicado em: 12/10/2014

Preciso começar com um alerta relevante: Wilson Vaccari é para iniciados. Aproxime-se dele como quem se aproxima de um campo minado onde plantaram um pé de maçã. Não é crime ler o que ele escreve, mas se você não for extremamente cauteloso ao interagir com este autor, corre o risco de despertar uma *shitstorm* rocambolesca. Se vocês me acham ogro, precisam conhecer o Wilson. Talvez esta reputação, merecida e herdada dos tempos de Orkut, explique porque eu frequentemente leio, mas nunca comento, e porque até hoje eu não criara a coragem de elogiar publicamente [o blog dele](http://wilvaccari.blogspot.com.br/).

Mas o diabo escreve bem, admiravelmente bem. Talvez não tão bem quanto ele acha que escreve, mas bem o bastante para que valha a pena ser lido. Compre-o pelo que ele vale e venda-o pelo que ele acha que vale e você terá feito um negócio da China.

O estilo de Vaccari é tão inconfundível quanto inclassificável, e talvez nisto esteja a sua modernidade. Apesar de pertencer a uma geração considerada “passada” pelos critérios etários, o seu estilo frenético e oblíquo apresenta uma linguagem surpreendentemente blogueira. Um tipo de memorialismo em pílulas, recheado de auto-ironias e inserido de narrativas que podem ser ficcionais, ou não.

Atualmente ele está publicando uma série autobiográfica intitulada “Amorokê do Paraíso” que se parece com uma viagem lisérgica. Eu sei que filmaram “On The Road”, apesar dos esforços do Kerouac, mas Wilson Vaccari parece ter sua própria obsessão em ser infilmável, inenarrável, irresumível. Seus textos não têm sinopse, esta talvez seja a sua glória maior: a sinopse é um *tweet* pretensioso que pretende explicar um livro. Quando bem sucedida, é um sinal seguro de que a obra não merece ser lida, pois alguém que não é um autor famoso conseguiu condensar o espírito da obra em três ou quatro linhas.

Tal como Nietzsche, sua obra produz aforismas impecáveis a cada dois ou três parágrafos. Mas elas não são lapidares, não podem ser extraídas e postas num quadro. São perfeitas enquanto inseridas no caos. Retiradas dele, são frases planas, simples. A literatura de Vaccari não é só irresumível, é também inantologizável (sei que as duas palavras não existem, ó corretor ortográfico, mas permiti-me seu uso). Sua obra é um fluxo, trazer uma garrafa d’água não resume nem preserva o rio. O que você tem que fazer é ir lá, sentar numa pedra à margem e contemplar. Cuida de não atirar nenhuma pedra que perturbe a água, ou pode um boto místico voar de dentro dela e te arrastar ao remanso.

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