Aqueles que nunca tentam ainda subestimam as catástrofes da derrota, e os que falharam superestimam os confortos da covardia. Perder é horrível, falhar é cabuloso, acovardar-se é detestável, não viver por medo de errar o tornará um velho amargo.
Sou especialista em ambas as coisas porque tenho um longo histórico de covardias alternadas com falhas e sucessos de vários tamanhos. Aos quarenta e seis anos posso dizer com certeza de que não há pior ou melhor, sempre que enfrentar uma escolha difícil, falhar ou fugir será igualmente dolorido, só mudará o tipo de dor. Com o tempo aprendemos que dor é dor, não importa onde dói.
Lamento ter me acovardado em situações simples da vida, como o dia em que os colegas de classe, em 1989, fizeram planos de sair na hora do intervalo e irem à Feira de Santa Rita, na praça a dois quilômetros da escola. Metade da turma foi, inclusive a menina que eu gostava. Eu não: fiquei para os dois horários extras e ela, nesse dia, começou a namorar outro cara. Nunca mais a tive depois disso. Nossos destinos se separaram de maneira irremediável.
Lamento ter me acovardado ao tomar posse em meu primeiro emprego: pedi para ficar perto de casa em vez de pedir para ir para uma filial distante, cortar o umbigo de uma vez. Fiquei junto da família e mantive o pé de meu espírito preso às preocupações de casa. Agora, na quinta-feira da vida, lamento não ter sido ousado quando podia — e agora já não posso.
Lamento não ter sido mais corajoso em dois ou três relacionamentos que teriam sido muito felizes, tanto quanto lamento ter insistido em outros que deram errado. Abandonei quem me amava e persegui amores impassíveis.
Lamento ter abandonado a faculdade de história em 1993 e ter retornado em 1994 — devia ter aproveitado a oportunidade e feito Letras. Talvez devesse ter adiado por uns anos e investido na carreira. Não fez diferença, pois só fiz pós-graduação em 2005.
Lamento ter investido a grana da minha indenização em um curso de espanhol, em vez de ter comprado vacas. Tornei-me um professor desempregado um ano depois, em vez de um bem-sucedido pecuarista, sucessor do negócio da família. Hoje meu pai está idoso e perto de morrer e a terra que explorava ficará abandonada.
Lamento ter magoado muitos amigos e namoradas através de atitudes impensadas, tanto quanto lamento os ter magoado por não ter tomado as atitudes que devia. Lamento por Luciene, que deixou um bilhete apaixonado entre as folhas do meu caderno no último dia de aula do primário, quando já sabia que eu mudaria de classe no ano seguinte. Fiquei anos sem abrir aquele caderno e só soube da paixão dela por mim — ela que eu achava tão linda — depois que ela já era casada e mãe de filhos.
Lamento não ter dado continuidade ao meu processo de emigração para a Nova Zelândia em 2001, embora eu talvez lamentasse ter emigrado e me afastado de meu país. Hoje as portas da emigração estão estreitas e não cabem um sujeito de 46 anos em meio a uma crise mundial de refugiados.
A vida é feita de erros e acertos. Você não tem como acertar todas as vezes, mas não vai errar sempre, a menos que seja um incompetente teimoso e sem humildade. Afora esses arrependimentos que listei, tenho muitos sucessos que não dão crônica, dos quais não gosto de falar. Mineiramente, prefiro preservar o anonimato das coisas que me dão prazer, mesmo depois que terminam, porque sempre se pode voltar ao abrigo antigo.
Meu conselho é que escolha bem quais batalhas vale a pena lutar. Mesmo esta escolha vai falhar certas vezes. O arrependimento é um fato da vida. Todo mundo que diz não ter arrependimentos é porque está mentindo ou tem pouca imaginação para pensar em outras possibilidades.