Na minha cidade havia uma casa enorme, mansão dos tempos dos barões do café, que estava abandonada e tinha um jardim também impressionante. O jardim ficava detrás de altos muros e estava tomado já de ervas, depois de décadas de esquecimento. Mas quando olhávamos pelas gretas do portão, víamos lá dentro aquelas árvores exóticas, aquelas fontes onde já não jorrava água, cobertas de mato. Havia uma dignidade, uma disposição artística ali. Algo que o descuido não apagava.
Era um desafio comum em minha infância saltar o muro, à noite, e passar algum tempo dentro daquela casa, que dizia-se assombrada. Assombrada não sei, mas era assombrosa. Com suas paredes enfeitadas de estuque, seu alpendre aristocrático, seu jardim com fonte e estátua de cupido.
Com o tempo foi ficando perigoso entrar lá, mesmo de dia. O crime ocupando os espaços da poesia. Mundo estranho esse, no qual os lugares esquecidos passam a servir para a morte, e não para o sonho.
Um dia, finalmente, demoliram a construção e ergueram no lugar outra pilha de “engradados de guardar gente”. Agora, sim, creio eu, aquele terreno inóspito vive assombrado pela lembrança da beleza que lá existiu.