Escrever contos é uma atividade das mais prazerosas, se bem que difícil. Para mim especialmente, escrever histórias sempre foi — mais que um mero requinte — um objetivo que eu sentia essencial, um desafio de caráter quase pessoal a que me propus desde que escrevi meu primeiro poema sobre a “Chuva” (1988, perdido).
No entanto, foram necessários muitos anos até que minhas primeiras tentativas bem-sucedidas viessem à luz. Esta demora deveu-se, em parte, à minha convicção de que escrever histórias era extremamente difícil e demandava muito tempo — coisa que absolutamente não tinha para gastar.
Meus primeiros contos só foram escritos à época da revista trem azul, em 1997, por insistência de meu parceiro na edição, Emerson Cardoso. Dos que escrevi naquela época, só sobreviveram ao meu perfeccionismo os que publiquei. Todos os demais eu desprezei ou submeti a tantas mudanças que já não posso dizer que são os mesmos que escrevi naquela época.
Aliás, é justamente essa coisa de querer estar sempre reescrevendo e melhorando cada coisa que escrevo a maior dificuldade ao meu progresso como autor de ficção: simplesmente não consigo deixar um texto na gaveta sabendo que não está bom. Acredito que minha relação com meus textos seria menos severa se eu os publicasse: a publicação precoce eliminaria não só o excessivo pudor que tenho deles como também ajudaria a libertar-me deste tormento de querer torná-los perfeitos.
Em parte esta obsessão sempre se referiu ao fato de eu ter tido a impressão de que minhas primeiras narrações dependiam profundamente do trabalho do Emerson. Acontece que, embora eu goste do que ele escreve, vejo nele um caráter antiquado e algo “palavroso”: ele não é um narrador formado, ele não tem uma técnica definida, apenas talento. Além disso, eu não tive sobre minha ficção nenhuma influência decisivamente inspiradora como aconteceu com minha poesia, que cresceu sob os auspícios de Renato Russo, Manuel Bandeira, Roger Waters e — mais tarde — Neil Peart. Influências contraditórias, que definem o meu [parco] estilo.
Foi preciso que eu lesse e evoluísse muito até que meu estilo se tornasse próprio. Mas, de certo modo, eu ainda acho que minha ficção é um tanto primitiva. Tanto no mau sentido, de sua precariedade de inspiração e de execução, como no bom, não ser mero pastiche de autores conhecidos.