Não temos gato, mas temos o lado ruim de ter um gato. Se é que vocês me entendem. O vizinho tem o gato, nós temos cachorro, o Bob (formalmente chamado de Roberto Cachorrovich Viralatov, porque é quase um personagem de Dostoievski).
O Bob detesta o gato do fundo de sua alma lupina remanescente. O gato, bem, meh…
Toda noite o gato se deita para dormir na beira da varanda do vizinho, que é visível de nosso quintal. Bob vai até o gramado, o mais perto possível do bichano, e começa a latir como quisesse afastar a presença de Satanás. O gato fica se lambendo e dorme pacificamente como se os latidos fossem um nana, nenê. Dá para sentir a frustração do Bob, a menos de um metro do bichano, porém separado dele pelo muro e por um vão de quarenta centímetros, que é como um fosso de castelo medieval.
Quando Bob já se cansou de latir e pular e é vencido pelo sono, então age o demônio felino.
Bob se recolhe à sua casinha de madeira, nos fundos, e então o gato, com a calma dos liches saídos das profundas, salta sobre o muro e dali para o nosso quintal, CAGA e corre até o portão principal, por onde sai, antes que Bob o veja.