O problema do escritor é a vaidade. Existe uma obsessão pelo profissionalismo que se deve principalmente à vaidade: é preciso ser, ou parecer, profissional.
Todos querem ser pagos pelo seu “talento” e acreditam na teoria “televangelista” da “semente” e pagam seu “dízimo” para o deus-mercado editorial na esperança de que seu investimento hoje atraia os favores divinos (“sucesso, grana, fama e mulheeeeres”… conforme dizia a canção da Plebe Rude).
Isso é uma mudança radical que houve nos últimos 50 anos. Há 100 anos ser conhecido era mais desejado do que ser bem pago. O dinheiro vinha depois, e devia ser recusado em certas circunstâncias. Quando se chegava a um certo ponto, devia-se adotar uma postura olímpica, ter caráter, não se vender. Isso veio mudando.
Hoje o autor se expõe como um pedaço de carne no açougue e acha lindo isso. Quer ser pago até sem ter renome. Aceitar ser ghost-writer profissional, se for bem pago. Mas prefere, claro, ser bem pago e ser famoso. Nunca recusará o dinheiro, exceto claro, se for para aceitar uma quantidade maior.
Hoje se mede a honra por quão bem o homem (e a mulher) se vendem. Quanto mais vendido, mais notável. Quanto mais produto, mais desejado.
O hobbyista não espera o sucesso. Por isso é livre.
Aquele que se impõe como meta tornar-se profissional precisa do sucesso para deixar de se sentir incompleto. Por isso se escraviza a qualquer coisa.
Na vida religiosa teve gente que pastou porque o pastor mandou.
Na vida literária tem quem ouça uma oferta de 50 reais por exemplar de um livro de 70 páginas e não xingue quem a faz de ladrão.
A ideologia é uma força poderosa, normalmente a serviço do mal. Os seres humanos são espontaneamente capazes de fazer o que é razoável, mesmo que não seja o mais certo, somente a ideologia e a cultura podem convencê-los a fazer o mais errado, mesmo que seja absurdo.
A ideologia do momento é a do sucesso a qualquer preço. Você vale o preço que pagam por você. Se você não vende, você é um fracasso, se você não publica, você é um tolo, se você não é famoso, você é um nada.
Aqueles que galgam um degrau na escada olham para os que estão “lá embaixo” e se sentem como um mago mitológico no alto de seu zigurate, perto de deus.
Para a maioria esse degrau (a publicação) é o único. Vender alguma coisa é para uma minoria. Os que chegam lá em cima são em geral gente que já era rica antes (Paulo Coelho era compositor famoso já, Kéfera Buchman é de família de classe média alta, por exemplo) ou que chegou à literatura vindo de outros lugares onde já tinha fama (ambos os citados e mais uma renca de gente).
Mas haja vaidade nesse mundo. A vaidade nos retira o realismo, e nos faz querer o que está distante, pelo método menos possível — aquele que não foi seguido por quem está lá.